coincidências artificiais

"notar" coincidências é um processo ativo de ficcionalização ou de conceituação, perceber-se ser atingido por algo vindo do lá fora quando na verdade está se redobrando sobre uma questão interna, uma ordem secreta das coisas funcionando por analogia, pode ser a porta para o misticismo sempre babão, mas também para as suspeitas de que estamos numa simulação. “Paranoia pode ser simplesmente ter todas as informações.”

acabo de largar com algum espanto o livro Crash do J.G. Ballard sobre a minha cama, aberto na penúltima página, edição da Record. Um erro de digitação fez com que ao invés de carona estivesse escrito corona na página 203, o que era pra isso significar? Alguma espécie de sinal sendo passado pra mim penetrando a simulação? Essa palavra impressa em 1995 (ano em que nasci) esperando como um parasita por seu hospedeiro durante 24 anos para que eu a lesse. Isso que Ballard se referia como Deep Assignments? De qualquer maneira não deveríamos olhar para romances de ficção científica como modos de vida...
merda

23. Diz-se constantemente em Filosofia coisas como: “A pessoas afirmam que há um supermecanismo, mas não há.” Entretanto, ninguém sabe o que seja um supermecanismo.*

olhamos para gráficos como se não mostrassem antes de tudo os parâmetros que foram escolhidos sobre seus eixos, como se pudessem nos dizer algo sobre o que está acontecendo e não nossa incapacidade de arranjar esquemas que consigam operar numa conjuntura que está sob constante mutação. “Estamos confinados a maneiras de descrever seja lá o que se esteja descrevendo.” Visitamos os portões da Babilônia no museu, mas o mais relevante é o que os portões nos mostram sobre o museu e não o contrário. 


Essa foi a catástrofe da neurulação, um processo morfogenético dinâmico e essencial que transformou placas neurais durante a embriogênese em um tubo neural através de uma serie de dobras (foldings). O dito evento por sua vez pavimentou a estrada para a emergência e a complexificação do sistema nervoso central, ou o que René Thom chamou de “o orgão da alienação". **

“Deep assignments run through all our lives; there are no coincidences.” Toda a informação que consumimos em feeds, nada ali é por acaso, coincidências artificiais,  tudo é, entretanto, tão chato — tédio operacional. 

 O único eixo sobre o qual nós podemos nos mover presos na ilha/cela de nosso espaço interior (inner-space) é o tempo. e todas as suas veias, explodindo em varizes, conduzem a um presente que se assemelha a coisa nenhuma, nati-morto, atravessado por inúmeras temporalidades, como se fossem terminais abandonados para diversas rotas intergaláticas. 

“O ego rudimentar é o que pode ser chamado uma simulação adaptativa do organismo de si mesmo e de seu ambiente imediato.” **


*  WTTIGENSTEIN, Ludwig - Preleções sobre estética. In: WITTIGENSTEIN, Ludwig. Estética, psicologia e religião. São Paulo: Cultrix, 1978. pp 13-66



** NEGARESTANI, Reza. - UNIDENTIFIED GLIDING OBJECT: THE DAY THE EARTH WAS UNMOOREDIn: BAUER, Marko e SKUFCA, Andrej (org.) Šum #11 Hypersonic Hyperstitions, [online] 2019, vol.11, pp. 1627-1658. Disponível em <http://sumrevija.si/en/issues/sum-11/>. Acesso em 18 de maio de 2020.

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